
Um dia me deparei com uma foto antiga de família. Uma foto de crianças vestidas com fantasia de carnaval, era uma festa, certamente na casa de meu pai. Reconheço meu pai pequeno, minha tia, meu tio. Observo as fantasias de época, penso em como deve ter sido pular carnaval antigamente. Vejo a sala, procuro colher dados daquela época. Mas meu olhar é atraido pela imagem de um menino vestido de palhaço no canto esquerdo. Não o reconheço. Seu rosto, sua expressão facial me encanta e me perturba.
As outras crianças que estão nas foto criam um conjunto bastante homogênio. Além de estarem mais agrupadas, nelas existe uma expressão, seja no olhar ou no sorriso, que me trazem a idéia de pose.
Percebo então uma dialética, dois polos que que criam uma tensão. O menino no canto esquerdo vestido de palhaço e as demais crianças .O palhaço disposto em um lugar mais escuro se destaca. Está um pouco afastado e não há ninguém atrás dele. O fundo escuro o destaca ao mesmo tempo que dramatiza a sua expressão.
“O que a Fotografia reproduz ao infinito só ocorreu uma só vez: ela repete mecanicamente o que nunca mais poderá repetir-se existencialmente”( Barthes, Roland. A câmara Clara , 1984, pg.13). Talvez por isso as fotos antigas me encantem tanto. A curiosidade de ver um outro tempo, uma realidade não vivida por mim, ser por um instante o olho que soube clicar aquele momento. Ver meu pai e meus familiares de forma tão estranha a mim. Estar lá sem estar nele, presencia-lo. Mas não, não é isso que me causa espanto nesse caso.
Gosto da foto, e o motivo vai muito mais além do que a sua referência histórica ou familiar.
A foto me toca pela sua composição, pela dialética formada pelos dois conjuntos, é isso que me atinge. Quase posso ouvir o instante do click. Aquele determinado instante, escolhido pelo fotógrafo. O momento exato da careta do palhaço, enquanto os outros posavam imóveis.